Vergilio
1º Tratamento, 08/12/2012
"O encontro das nossas forças, do que queremos com as forças dos outros. Esse embate.
Do perceber que tem que ser assim. De que isto é um jogo de forças. Isto é o que nos sustenta e nos alimenta. Isto é o que nos mantém vivos.
Nos mantém, a sermos nós próprios e não o que os outros querem para nós. E o que nos alimenta, porque sem isto eu não tenho que comer. O que sinto a confundir-me. Se perco o que penso e sou, vou ficar a ser o quê? Prefiro não sentir o que mandam.
Se eu pudesse agora opor com a minha força, mas já não funciona.
Se não funciona é porque não é.
Se a vossa funciona é porque eu tenho que a receber agora. Isso eu entendo. O que ganho agora em continuar a resistir?
É como quando vem um temporal. Quem o consegue segurar?
É que era tão cansativo ficar todo o tempo a enfrentar os outros."
2º Tratamento, 26/12/2012
"Ansiedade. Que chatice de emoção. Que nos abana a todos de alto a baixo. Tem aquele que quer fazer e o que não quer fazer.
Envolve-nos a todos e consome-nos. Que vontade de pegar num aspirador. Estou na ansiedade de ver os filhos crescer, a horta, a casa, o dinheiro, a paciência, a amizade, o que deixou de me falar, o que me deve não sei o quê.
Que falta de paciência que temos. Que doença mais generalizada.
Que peste meu Deus. É a peste dos nossos, vossos e de todos os tempos. Acho que esta peste nunca largou os homens.
Podíamos ao menos inventar uma vacina.
É o polícia que está ansioso por multar e eu para não ser multado; o que quer fazer leis e eu espero que não faça; o que me constrói a casa e eu que a desejo pronta porque preciso, mas não tenho pressa porque tenho de a pagar.
Que chatice, hoje não há nuvens no Céu e logo hoje a horta está seca. Lindo dia diz o meu compadre que vai para a praia e espera que não chova.
Eu já nem quero saber fazer nada, depois vou querer aprender mais e depois estou ansioso porque não sei o suficiente.
E o miúdo que quer crescer e que nunca mais chega, e a mulher que quer dar à luz e os dias que falta para sair da prisão.
Ah liberdade onde estás, que quando te tenho não sei dar o valor à tranquilidade que é preciso para viver.
Ah se eu tivesse tranquilidade suficiente para distribuir por esta gente faminta, coitados, esfomeados de serenidade.
Montes de vacinas de tranquilidade. Façam fila que bicha já não se diz. Alinhados, todos vamos anular o flagelo da humanidade.
Mas despachem-se, a minha mulher está à espera porque o meu filho tem que estudar, porque o professor necessita, o diretor tem prazos, o presidente da câmara pensa poder ser posto na rua.
Todos em fila por amor de Deus venham à vacina que salva as vossas almas.
Todos precisamos queimar a peste que nos afoga.
A minha mulher já mandou uma mensagem, está a ficar nervosa, acho que amanhã tenho que carregar o telemóvel e a renda da casa, porque os bifes estão a acabar e o padeiro nunca mais chega.
A sorte é que está chegando a Primavera.
Mais uma oportunidade de deixarmos florir a nossa bendita tranquilidade. Mas sem chuva não sei não!
Se eu conseguir aproveitar toda essa energia linda que me mandam."
Mensagens canalizadas por José e Palmira